Direção: Tony Scott
Gênero: Suspense/Drama
Duração: 96 min.
Ano: 1983
“Estiloso!
Explícito! De tirar o fôlego!”
(Los Angeles Times)
A
sofisticação de um clássico gótico sublime
No início
da década de 80, época em que Anne Rice estourava no mundo apresentando uma
revolução na mitologia e nas histórias de vampiros com o célebre “Entrevista
com o Vampiro”, um diretor estreante assumiu a responsabilidade de levar às
telas uma trama inovadora, na qual não faltavam nem a atmosfera gótica nem o
erotismo mórbido e intenso tão bem explorados nas obras de Rice. Em “Fome de
Viver” (The Hunger),Tony Scott – irmão do cineasta Ridley Scott – apresenta uma
das obras mais cultuadas e originais do gênero, dando uma perspectiva
sofisticada à temática vampiresca, já um tanto “marginalizada” em produções
repetitivas ou trash.
Baseado
no best-seller homônimo de Whitley Strieber, “Fome de Viver” conta a história
de Mirian Blaylock (Catherine Deneuve, simplesmente perfeita no papel), uma
mulher misteriosa, elegante... e imortal, que sobrevive através dos séculos com
o sangue de seus amantes. Juntamente com John (David Bowie), seu atual amante, com
quem aparentemente forma um casal de ricos góticos, Mirian seduz pessoas,
roubando-lhes a vida e destruindo os vestígios após se alimentar. O diferencial
de “Fome de Viver” começa nas próprias características dos personagens
centrais: aqui, os sugadores não queimam ao sol (mas, obviamente, também não
brilham diante dele), não temem alho ou crucifixos e nem são demônios
irracionais; o ponto principal, porém, diz respeito à curiosa forma como se
alimentam. Mirian e John não possuem presas aguçadas como os vampiros
tradicionais; para matar as vítimas, utilizam pingentes em forma de ank (um
símbolo egípcio) que ocultam uma pequena lâmina, com a qual cortam os pescoços
das pessoas. Falando assim, haverá muitos indivíduos que estranharão essa forma
de “ser vampiro”, mas é interessante notar que, no decorrer do filme, a palavra
“vampiro” não é pronunciada nem uma única vez; de fato, isso é uma conclusão a
que o espectador chega ao saber que eles sobrevivem com sangue humano, são
imortais, gostam de roupas sóbrias e escuras – sem abrir mão da sofisticação – e
preferem andar à noite.
Conforme
a trama avança, John passa a sofrer os efeitos de uma raríssima doença
degenerativa que provoca um envelhecimento acelerado; preocupada com ele, Mirian
recorre à ajuda da Dra. Sarah Roberts (Susan Sarandon), uma médica especialista
no assunto, mas os rumos tomados a partir de então são totalmente inesperados.
Nasce entre elas um vínculo homoerótico que culmina em uma das cenas de sexo
lésbico mais icônicas do cinema.
Combinando
o complexo drama do relacionamento entre Miriam e Sarah, e unindo a isso a
melancolia da imortalidade, da solidão e da morte, o filme de Tony Scott tem
razões suficientes para figurar como um dos filmes mais renomados quando se
fala em história gótica. Chama a atenção no filme, justamente, a forma como os
elementos da cultura gótica se agregam e ajudam a tecer um conjunto de
organicidade exemplar: a trilha sonora “dark”, a fotografia escurecida e sombreada,
propositalmente com pouca luz, os diálogos e até os gestos e trocas de olhar,
tudo possui um sentido, um porquê, embora sob uma camada sombria de contextos. O
roteiro de Ivan Davis e Michael Thomas favorece o desenvolvimento da trama com
a sutileza necessária para que Catherine Deneuve transmita, gradativamente, a
morbidez e a consciência de que a imortalidade é mais uma tortura do que uma
dádiva, o que justifica a intensidade com que ela deve aproveitar a vida efêmera
dos seus amantes.
As interpretações
de Susan Sarandon e de David Bowie também acrescentam visões particulares dentro
do contexto do filme: Sarah, mostrando a médica segura que vê suas crenças se
diluírem ao se envolver com Mirian e experimentar algo que não imaginava ser possível;
John, evidenciando o sofrimento que acompanha a degradação física e moral que o
acompanha a partir do momento em que passa a sofrer sua doença e refletir sobre
sua relação com Mirian.
Finalmente,
o clímax do filme é excepcional, unindo o drama da perda a uma cena típica de
terror com direito a alguns sustos substanciais e um horror visual marcante. Mais
de trinta anos após seu lançamento, “Fome de Viver” ainda se mantém em status
de filme Cult e, mesmo que não siga a cartilha tradicional de vampiros monstros
e nem tenha sido mais um sucesso meramente comercial, preserva a essência
obscura e tétrica da psicologia vampiresca, sem ridicularizá-los com a patética
apelação romântica adolescente que se tornou modismo contemporâneo.
Conceito: Excelente
Nota: 10,0
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