quarta-feira, 16 de outubro de 2013

Crítica: O Leitor



Direção: Stephen Daldry
Gênero: Drama
Duração: 124 min.
Ano: 2008

...uma obra-prima... (New York Observer)

Filme de Daldry fala sobre verdades, passado, sexo e vergonhas

Quando o talento de um diretor encontra uma obra profunda à qual pode dar vida nas telas, o resultado tende a ser bastante positivo; entretanto, se o diretor e os demais envolvidos na produção conseguem trazer para o filme as atuações responsáveis de atores comprometidos com o verdadeiro significado da palavra ‘cinema’, o resultado passa de positivo a fascinante. Este definitivamente é o caso de “O Leitor” (The Reader).
     “O LEITOR” é um filme perturbador em sua trama, multifacetado e pulsante, do diretor Stephen Daldry (aclamado por seu trabalho em “AS HORAS”). Baseado no best-seller de Bernhard Schlink – com grande fidelidade –, o longa se passa na Alemanha devastada e em processo de reconstrução, logo após a Segunda Guerra. 
      No início, vemos Michael Berg (Ralph Fiennes, de “O JARDINEIRO FIEL”) recordando-se de sua juventude, quando, em 1958, aos quinze anos de idade, conheceu Hanna Schmitz (Kate Winslet, de “TITANIC”, sempre impecável), uma mulher solitária e misteriosa, bem mais velha que ele, com quem começa a ter uma espécie de iniciação sexual.  Daí em frente, ocorre o que parece ser um pacto: Michael lê trechos de livros para Hanna, já que ela gosta de ouvir leituras. Em troca, ela faz amor com ele, num ritual que, se considerarmos o filme como um todo, assemelha-se a um tipo de terapia recíproca, uma vez que cada um deles transparece ao outro e para nós, espectadores, a sua incompletude existencial; ambos, assim como o restante de nós, possuem segredos, vergonhas, limitações pessoais. Entretanto, essa situação fica delicada com o passar do tempo, pois seu relacionamento estreita-se de forma crucial e irreversível, magoando a ambos e “redimindo-os” de seus conflitos pessoais através da companhia e do sexo.
       O caso deles dura apenas um verão, depois do qual os dois acabam por se separar e, quando Michael está na faculdade de Direito, assiste ao julgamento de Hanna, acusada de participar dos horrores do campo de concentração de Auschwitz. A partir daí, a história entra na parte em que se emaranha nas buscas de respostas, valores, e na perturbação em que Michael fica, impotente diante daquela situação, que vem reabrir antigas feridas e pôr em questão tudo aquilo em que ele acredita(va) a respeito de suas próprias experiências de vida.
O desenrolar doloroso e sem perspectivas de um “final feliz” para os protagonistas, cada qual preso em sua própria teia de sofrimentos e vergonhas ancoradas no passado, mas que estão sempre vindo à tona, conduz a dois principais caminhos: Hanna enfrentando, afinal de contas, seu maior medo/vergonha e superando este desafio, mesmo que sua redenção se faça através da expiação pela morte. Já Michael avalia, ainda hesitante, a profundidade e a influência de seu passado no agora, numa perspectiva angustiante e com resquícios de remorso que o acompanhará para sempre. Tudo isso ocorre de forma arrebatadora e psicologicamente progressiva, sem precipitações ou lacunas.
            Obviamente, faz-se necessário dizer algo acerca das características técnicas de uma obra tão ímpar. “O LEITOR” foi indicado a cinco Oscars – inclusive os cobiçados “Melhor Filme” e “Melhor Diretor” - destacando-se com “Melhor atriz” - Kate Winslet, que também ficou excelente na maquiagem pesada de idade avançada, já no final da película, com uma interpretação fantástica. Stephen Daldry conduz o filme de forma afiada, oscilando entre a linha tênue da perturbação e da comoção, o que imprime à trama todo o impacto necessário, fazendo-nos refletir sobre a importância daquilo a que chamamos "verdade" e "moralidade", quando vemos, por exemplo, a postura resignada de Hanna ou a covardia sistemática de Michael, conforme ele amadurece e deixa para trás seu lado mais impulsivo.      
A respeito do personagem Michael, certamente o ponto central do filme, já que este se estrutura em suas memórias (afinal de contas, ele é “o leitor”), há que se destacar interpretação de David Kross, que incorporou o jovem Michael muito bem, encaixando-se perfeitamente na interpretação posterior de Ralph Fiennes como o Michael mais velho. É interessante ver o contraste de suas atuações, que se agregam de formas muito diferentes: Kross, como o jovem arrebatado no início; Fiennes como um sujeito introspectivo. Kate Winslet, então, ao ganhar o Oscar e o Globo de Ouro por melhor atriz, dispensa quaisquer comentários a respeito de sua interpretação. 

      Quando termina “O LEITOR”, uma projeção que perturba e intriga, ficam muitas questões a ser debatidas: o quanto a verdade ou a moralidade são fundamentais? Quem é autor da verdade? A sociedade é guiada por que valores? Até que ponto podemos intervir no curso dos eventos que se desencadeiam ao nosso redor? “O LEITOR” não fornece respostas, uma das razões pelas quais ele é tão instigante. Basicamente, ele nos questiona sobre aquilo a que nem nos damos ao trabalho de pensar. Fica a mensagem do pôster: "Resolva este mistério"; mensagem aplicada ao conteúdo do longa-metragem e às nossas próprias existências, tão vazias às vezes.


Conceito: Excelente
Nota: 10,0



CURIOSIDADES SOBRE ESTE FILME

v Kate Winslet foi, desde o princípio, a atriz que o diretor Stephen Daldry queria para o papel de Hanna Schmitz, mas houve contratempos, já que ela estava “presa” às filmagens de “Foi Apenas um Sonho”;
v A atriz Nicole Kidman chegou a ser contratada para substituir Winslet, mas também teve que desistir do papel devido à sua gravidez;
v Juliette Binoche chegou a ser cotada para o papel;
v Essa demora na escolha de uma atriz deu tempo suficiente para que Kate Winslet finalmente pudesse aceitar o papel;
v Os produtores Sydney Pollack e Anthony Minghella morreram antes da conclusão do filme;
v “O Leitor” foi indicado aos Oscars de: Melhor Filme, Melhor Roteiro Adaptado; Melhor Atriz (no qual venceu), Melhor Diretor e Melhor Fotografia;

v O filme foi indicado também às categorias principais do Globo de Ouro e do BAFTA, vencendo com “Melhor Atriz” em ambos.

TRILHA SONORA



No vídeo a seguir, o diretor Stephen Daldry comenta o filme:




Para conhecer mais sobre o contexto do filme, acesse o vídeo seguinte, no qual Stephen Daldry e David Kross falam mais detalhadamente sobre a produção e suas perspectivas: http://www.youtube.com/watch?v=WajGBlGbS_c

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